"Calú di Zita": A Trajetória de Princezito na Preservação da Cultura Cabo-Verdiana
Princezito: A Voz da Resistência Cultural de Cabo Verde
Carlos Alberto Sousa Mendes, mais conhecido como Princezito, é uma figura proeminente na cena cultural de Cabo Verde. Músico, compositor, intérprete, escritor e ativista cultural, ele é um defensor fervoroso da preservação e divulgação do património imaterial do seu país. Nascido em 20 de setembro de 1971, na cidade de Tarrafal, Princezito cresceu em um ambiente rico em tradições musicais, moldando-se como um artista que interliga suas várias facetas em uma profunda pesquisa cultural e resistência à marginalização da cultura cabo-verdiana.
Raízes Musicais e Formação Artística
Princezito cresceu em Monte Iria, um local imerso na tradição musical, onde teve a oportunidade de aprender com figuras notáveis como a lendária cantadeira Nha Bibinha Cabral. Desde muito jovem, ele foi imerso nas sonoridades do Batuku e do Finason, formas tradicionais de música e dança cabo-verdiana. Sua formação artística foi nutrida pelo contato com os mais velhos da comunidade, que lhe transmitiram não apenas técnicas musicais, mas também a importância da memória e da ancestralidade.
Como o nono filho de uma família numerosa, sua trajetória na música começou na escola primária da vila de Mangue, onde destacou-se pela sua habilidade em declamar poemas e por sua criatividade. O apoio dos irmãos mais velhos e a admiração de professores e colegas solidificaram sua determinação em seguir o caminho artístico.
A Trajetória Musical de Princezito
Natural da Ilha de Santiago, Princezito começou sua trajetória musical ainda jovem, imerso nas tradições da música cabo-verdiana. Sua formação abrange uma variedade de gêneros, mas seu foco principal reside no batuku e no finason, estilos que incorporam elementos da música popular e da herança africana. Essa diversidade permite que ele crie uma sonoridade única, que ressoa com a riqueza cultural de Cabo Verde.
Projeto Ayan: Uma Revolução Musical de Cabo Verde
O Projeto Ayan é um marco na história da música cabo-verdiana, congregando artistas em torno da pesquisa, atuação e gravação de um CD de música tradicional estilizada. Sob a liderança de Carlos Alberto Sousa Mendes, conhecido como Princezito, o Ayan transformou o conceito de Batuku, modernizando-o sem perder suas raízes. Este projeto não apenas trouxe à tona novos talentos, mas também consolidou uma nova geração de músicos que buscavam inovar enquanto preservavam a rica herança cultural de Cabo Verde.
A Etimologia e o Significado de Ayan
A palavra "Ayan" é rica em significado e se encaixa em diferentes contextos culturais. Em Cabo Verde, é um advérbio e substantivo que expressa um forte "sim", um "de acordo", ou um "isto vai durar". Além disso, a palavra aparece em várias culturas e idiomas, incluindo francês, árabe e algumas línguas africanas, onde é utilizada como nome próprio. Esse caráter multifacetado e a sonoridade agradável tornam "Ayan" um símbolo de autoridade e respeito, associado a algo superior e de certeza inquestionável.
Um Novo Paradigma no Batuku
O disco coletivo "Ayan - New Music from Cabo Verde" é uma das principais realizações do projeto. Com a participação de artistas como Djingo, Tcheka e Vadú, a proposta visava modernizar o Batuku, uma expressão cultural profundamente enraizada, sem adulterar suas origens. Através deste trabalho, o Ayan lançou as bases para uma nova narrativa musical que promoveu a diversidade temática e estilística, refletindo a riqueza cultural do arquipélago.
Geração Pantera e a Evolução Artística
Embora a morte do músico Orlando Pantera tenha gerado a nomenclatura "Geração Pantera" para descrever o grupo de artistas envolvidos no Ayan, os próprios músicos rejeitaram essa designação. Eles consideram que o projeto Ayan e a dinâmica artística que dele emergiram não estavam restritos à figura de Pantera, mas eram fruto do esforço coletivo de vários artistas que, embora compartilhassem afinidades temáticas, seguiram suas trajetórias de forma independente e bem-sucedida.
Além de Princezito, Tcheka, Vadú e Djingo, outros artistas se destacaram durante esse período, e cada um deles contribuiu para a evolução da música cabo-verdiana. Apesar da perda trágica de Vadú, os demais seguiram em frente, levando adiante os valores e conceitos do Ayan.
Impacto e Legado
O impacto do projeto Ayan transcendeu suas gravações, influenciando uma nova geração de artistas crioulos. Os valores e a pedagogia do Ayan foram transmitidos, inspirando diversos projetos colaborativos que têm surgido, como a Gala Harmonia, Oru Femia e Amorzade. Esses eventos celebram a diversidade musical de Cabo Verde e reafirmam o legado do Ayan como um divisor de águas na música tradicional e contemporânea do país.
O Álbum "Spiga"
Lançado em 8 de agosto de 2008, Spiga é o primeiro álbum solo de Princezito e um marco na sua carreira. Com 12 faixas, o disco não apenas apresenta uma fusão de estilos, mas também aborda questões sociais e culturais. Princezito utiliza sua música como uma plataforma para refletir sobre a vida, o amor, a identidade e os desafios enfrentados pela sociedade cabo-verdiana.
O álbum foi produzido por Hernani Almeida e inclui o DVD Portrait Of Princezito, que oferece um olhar mais profundo sobre o artista, incorporando imagens da cultura e paisagens de Tarrafal. O DVD também apresenta uma biografia em primeira pessoa, entrelaçando suas canções com referências à identidade cultural de Cabo Verde.
Temas e Mensagens
A obra de Princezito é marcada pela exploração de temas que vão além da música. Em suas letras, ele frequentemente aborda a dignidade humana, as injustiças sociais e a valorização da cultura. Faixas como "Bakandesa" e "Tamara" destacam a luta contra o colonialismo contemporâneo e a celebração do papel da mulher na sociedade, refletindo novos paradigmas de masculinidade e amor.
Reconhecimento e Impacto
Princezito é amplamente reconhecido por seu papel como um defensor da cultura cabo-verdiana. Seu trabalho não só entretém, mas também educa e provoca reflexões importantes sobre a identidade e os desafios da sociedade. Através de suas canções, ele consegue cativar um público diversificado, ressoando não apenas em Cabo Verde, mas também entre a diáspora cabo-verdiana em todo o mundo.
Princezito: A Voz da Poesia Cabo-Verdiana
Carlos Sousa, conhecido artisticamente como Princezito, é um dos poetas mais proeminentes da literatura cabo-verdiana contemporânea. Desde a sua estreia literária com "Antigu Pensamentu" em 2015, ele tem se destacado não apenas pela sua habilidade em capturar a essência da cultura cabo-verdiana, mas também pela profundidade e musicalidade de sua poesia.
A Primeira Obra: "Antigu Pensamentu"
Lançado em um ambiente carregado de emoção e arte no auditório Jorge Barbosa, em Praia, "Antigu Pensamentu" apresenta um corpo poético que reflete a contemplação da vida e da natureza. Em seu prefácio, Mário Lúcio, seu irmão e um dos mais respeitados nomes da literatura cabo-verdiana, descreve a poesia de Princezito como um "espelho de água", ressaltando a leveza e a profundidade das suas palavras. O livro, que conjuga saberes antigos com uma linguagem inovadora, foi rapidamente reconhecido como um clássico moderno. A obra não só resgata a tradição poética, mas também a reinventa, criando um diálogo entre o antigo e o novo, o erudito e o popular.
A Musicalidade e a Temática de "Manual di Mudjer"
Seguindo a linha do seu primeiro livro, Princezito lançou "Manual di Mudjer", uma coletânea de Finason que explora a figura feminina na cultura cabo-verdiana. Dividido em quatro cantos, este trabalho é uma ode à mulher, abordando a sua força e resiliência através de versos ricos em sonoridade e imagem. A poesia aqui não se limita a meros versos, mas se transforma em narrativas complexas que retratam personagens e realidades sociais, revelando a profunda conexão do autor com sua terra e seu povo.
A musicalidade é um elemento central na obra, refletindo a tradição oral da cultura cabo-verdiana. Princezito utiliza a língua como uma ferramenta de expressão, explorando suas nuances e ritmos. Ele enriquece seu repertório lexical com neologismos e referências ao crioulo profundo, reforçando a riqueza cultural que permeia sua escrita.
Um Artista em Evolução
Princezito, apelidado de "O Pequeno Príncipe", também é conhecido por sua originalidade e improviso, habilidades que o tornaram um destaque nos palcos. Sua trajetória artística é marcada por um compromisso com a autenticidade e a busca de uma identidade que reflita a complexidade da vida cabo-verdiana.
Além de sua produção literária, ele é um defensor da valorização da cultura e da educação artística. Influenciado por figuras como Nha Nácia Gomi, outra referência na música cabo-verdiana, Princezito se inspira na tradição do batuku e do finason, trazendo à tona temas relevantes e contemporâneos, como a relação entre instrução e educação.
A obra de Princezito é um testemunho da vitalidade e diversidade da literatura cabo-verdiana. Suas poesias, que vão do lirismo à crítica social, convidam o leitor a refletir sobre questões universais através da lente única da cultura de Cabo Verde. Ao mesclar tradição e inovação, Princezito não apenas enriquece o panorama literário, mas também se estabelece como uma voz importante na luta pela preservação e promoção da identidade cabo-verdiana. Com um olhar sempre voltado para o futuro, ele continua a construir uma obra que ressoa com o coração e a alma do seu povo.
Princezito é mais do que um artista; ele é uma voz vibrante da resistência cultural de Cabo Verde. Sua trajetória é um testemunho do poder da música como ferramenta de transformação social e preservação cultural. Com uma profunda conexão com suas raízes e um compromisso com o futuro, Princezito continua a inspirar gerações, lembrando a todos nós da importância de valorizar e preservar o rico património imaterial de Cabo Verde.
Fonte: Soca Magazine, Augusta Teixeira
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