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A Nação "Silenciada", Por Mario Loff

A Nação "Silenciada"

 A Nação "Silenciada"

Após a independência, a televisão nos mostrou a alegria das comemorações da liberdade, transmitindo imagens de um povo vibrante e esperançoso quanto ao futuro, tudo em preto e branco. No entanto, quando as câmeras se voltaram para a sede da emissora Tevec, a conexão entre a televisão e o povo começou a se desintegrar. Surgiram barreiras: pagar para ver e assistir (mesmo sendo TV pública) apenas ao que queriam que víssemos. A partir desse momento, a população foi relegada a uma posição passiva, tornando-se meros espectadores de uma realidade imposta pelos senhores novos que chegaram ao país e a capital. A televisão, que antes era uma janela para a verdade, transformou-se em um instrumento de controle e manipulação, refletindo apenas as narrativas que prevaleciam.

As notícias passaram a enfatizar exclusivamente os grandes feitos governamentais e questões políticas, ou a relatar tragédias locais que afetam a vida das pessoas comuns, relegando aos bastidores os debates emergentes e cruciais que moldam a nação, bem como outros problemas verdadeiramente prementes e prioridades da sociedade.

Nos dias atuais, é mais provável que um ancião testemunhe o ciclo completo de um jovem – desde o nascimento até a morte – do que ele próprio encontre o descanso eterno. Este fato revela não apenas as falhas intrínsecas ao projeto da nossa nação, mas também os desafios na postura dos adultos, cujas expressões de ódio nas redes sociais muitas vezes causam espanto pela sua desproporcionalidade, considerando suas supostas maturidades e experiências de vida.

A sabedoria de Chinua Achebe ressoa com pertinência ao refletir sobre o estado atual, quando ele afirma: “A verdadeira essência da cultura não é um conjunto de tradições, mas a forma como o povo vive e interage.” Observamos que a proliferação do ódio e da intolerância nas redes sociais é um hábito crescente, alimentado pela discordância e pela divergência de interesses. Este fenômeno, infelizmente, tende a aprofundar a segregação e a polarização dentro da nossa sociedade, distantes de um diálogo construtivo e da coesão social.

Aqueles que viveram sob o jugo do colonialismo e sentiram na pele os ventos da independência, que outrora dançaram ao compasso do bailado na várzea, agora se limitam a observar em silêncio. Suas vozes, que um dia explodiram com força, mal se fazem ouvir, nem sequer despertando um gesto de apreço ou um simples aceno nas vastas redes da modernidade.

A história de muitos países ao redor do mundo demonstra que o conhecimento é uma força poderosa para a mudança social e política. Tomemos, por exemplo, a Revolução Americana no final do século XVIII. A disseminação de panfletos e publicações, como os escritos de Thomas Paine em Common Sense, mobilizou a população para lutar pela independência. O poder das ideias circulando livremente, acessíveis a todos, foi um catalisador para a transformação política e social. Semelhantemente, a Revolução Francesa foi precedida por um intenso debate intelectual, promovido por filósofos iluministas como Voltaire, Rousseau e Montesquieu, cujas ideias sobre igualdade, liberdade e justiça social foram amplamente discutidas e lidas pela população.

Na Índia, durante a luta pela independência do domínio britânico, figuras como Mahatma Gandhi e Jawaharlal Nehru utilizaram jornais e livros para educar e inspirar o povo indiano. Gandhi, essa figura controversa, escreveu extensivamente sobre não violência e desobediência civil. Seu pensamento provocava questionamentos sobre a legalidade e o poder que, muitas vezes, apenas traziam injustiça e miséria, inspirando milhões a seguir um caminho de resistência pacífica. O impacto do conhecimento e da leitura foi tal que não apenas uniu a nação, mas também influenciou movimentos de direitos civis em todo o mundo, incluindo o movimento pelos direitos civis nos Estados Unidos.

No caso da África do Sul, a luta contra o apartheid foi amplamente apoiada por intelectuais e escritores que usaram suas vozes para denunciar as injustiças do regime segregacionista. Escritores como Nadine Gordimer e Alan Paton expuseram as crueldades do apartheid em suas obras, alcançando leitores dentro e fora do país. Nelson Mandela, enquanto estava preso, continuou a ler e a escrever, compreendendo que o poder do conhecimento era vital para a libertação não apenas política, mas também mental do seu povo. Após a sua libertação, Mandela enfatizou a importância da educação ao afirmar: “A educação é a arma mais poderosa que você pode usar para mudar o mundo.”

Esses exemplos mostram que o verdadeiro progresso de uma nação não se limita a erradicar a fome ou a prover infraestrutura básica; envolve também alimentar mentes e corações com conhecimento e cultura. Em Cabo Verde, para onde caminhamos? A resposta parece clara: para onde quer que a educação e a leitura nos levarem. Se, logo após a independência, tivéssemos priorizado a educação massiva e o acesso ao conhecimento, talvez hoje tivéssemos uma sociedade mais crítica, mais engajada e mais capaz de se adaptar às exigências do mundo moderno, fica a ideia de que é a história unica que é a nossa orientação. Não que festivais e suas banalizações não sejam importantes neste país, também numa sociedade como a nossa, ela elege politicos e cria a estimação permanente, mas estes se tornaram espetáculos dentro de um cenário deprimente em que jovens são objetos de uso e promoção de uma ideia de estabilidade política de humildade, muitas vezes inócua e insensata. Este fato reflete a prioridade nacional em alguma escala. 

Desde a independência nacional, tem-se verificado que os sucessivos governos leem mais do que o povo. Quando o povo não lê na mesma medida que os governos, prevalecem a injustiça social, a manipulação, a corrupção e o endeusamento de figuras deploráveis, Cabo Verde é um país que o governo lê mais que o povo, como disse o poeta W.H. Auden, com sua aguda percepção sobre o papel da verdade na sociedade, escreve: “A verdade é o que acontece.” Esta frase sublinha a ideia de que a realidade social e política é moldada pela percepção da verdade e pelo acesso à informação. Quando a verdade é distorcida ou ocultada, a sociedade sofre as consequências de uma compreensão limitada e deformada da realidade, levando a uma cultura de desconfiança e desengano. 

Nações como a Finlândia e o Japão, que investiram profundamente na educação e na cultura, colhem hoje os frutos de sociedades altamente instruídas, inovadoras e economicamente prósperas. Na Finlândia, a leitura é cultivada desde os primeiros anos de vida, e o sistema educacional é concebido para fomentar o pensamento crítico e a criatividade. No entanto, por cá, não temos a mesma predileção pela crítica, nem valorizamos devidamente aqueles que criticam com fundamento. Suas vozes raramente encontram eco em nossas telas de televisão, exceto nas redes sociais, e fica a impressão de que cada um já tem seu time de bajulaçãoe poucos a desenvolviemnto de debete serios. A ausência de crítica e a incapacidade de absorver seus ensinamentos nos conduzirão inevitavelmente a um abismo. No Japão, o respeito pelos livros e pelo saber é intrínseco à cultura, refletindo-se numa elevada taxa de alfabetização e numa pujante indústria editorial.

Para Cabo Verde, o caminho do progresso passa pela valorização do que realmente acrescenta valor à nossa sociedade e pelo reconhecimento dos nossos intelectuais e escritores. Estes devem ser encarados não como figuras distantes, mas como aliados essenciais do povo. É fundamental que, mesmo com algum sacrifício, o povo mantenha em mente que a verdadeira salvação reside nos livros e na educação. Para alcançar algo significativo, é preciso abraçar tudo o que a cultura e o conhecimento oferecem.

A promoção da cultura de leitura deve ser uma prioridade em todos os níveis da sociedade. Os escritores cabo-verdianos precisam ser devidamente incentivados e comprometidos com a literatura. É digno de nota que, atualmente, os únicos poetas e escritores que verdadeiramente mantém uma agenda literária consistente e com um profundo compromisso com a literatura são os nossos renomado poeta José Luís Tavares, escritores Mário Lúcio e Germano Almeida e nesse pacote não esta nehuma mulher de registro. No caso do poeta José Luiz Tavares, apesar de frequentemente mal compreendido, ele se destaca como uma fonte de inspiração para aqueles que aspiram a se tornar grandes poetas e escritores. Seu trabalho é vital para compartilhar histórias e visões, contribuindo para a construção de uma identidade nacional sólida e orgulhosa.

Iniciativas de grande envergadura, como clubes de leitura, feiras literárias e programas de estímulo à publicação local, revestem-se de uma importância primordial ao estreitar o vínculo entre o saber e a população. Um exemplo notável desse impacto é a criação da Associação Literária de Tarrafal de Santiago (ALTAS), que começou como um simples clube de leitura e evoluiu para uma instituição literária de relevância. Estas ações não apenas promovem o acesso à cultura, mas também desempenham um papel crucial na consolidação do papel das instituições de ensino, desde as escolas até as universidades, que devem transcender suas funções pedagógicas tradicionais.

É imperativo que tais instituições assumam a nobre responsabilidade de se tornarem verdadeiros bastiões de aprendizagem profunda e reflexão crítica. Como afirmou o filósofo Immanuel Kant, “o esclarecimento é a saída do homem de sua minoridade autoimposta.” Portanto, é essencial que as instituições de ensino e os agentes culturais se empenhem em fomentar uma cultura de pensamento crítico e inovação, para que o saber possa florescer e se democratizar, enriquecendo verdadeiramente todas as camadas de nossa sociedade.

É fundamental que edifiquemos uma sociedade onde o acesso ao conhecimento seja um direito universal e o livro seja tratado não como um luxo distante, mas como um companheiro próximo e acessível. Na sabedoria de Albert Camus, “a verdadeira generosidade para com o futuro consiste em dar tudo ao presente.” A verdadeira prosperidade de nossa pequena civilização cabo-verdiana dependerá de nossa capacidade de democratizar o saber e fazê-lo florescer em todas as camadas sociais. Somente assim poderemos garantir que o conhecimento, em toda a sua plenitude e riqueza, seja uma fonte de enriquecimento e transformação contínua para todos.

Portanto, devemos abraçar a visão de grandes pensadores como Paulo Freire, que nos lembrou que “a educação não transforma o mundo. Educação muda pessoas. Pessoas transformam o mundo.” É nossa responsabilidade coletiva garantir que todos os cabo-verdianos tenham acesso a uma educação de qualidade, a oportunidades de aprendizagem contínua e a uma cultura de leitura vibrante. Se fizermos isso, poderemos olhar para o futuro com esperança, sabendo que estamos construindo uma nação onde o conhecimento e a cultura são verdadeiramente valorizados e acessíveis a todos, em que o saber e a criatividade floresçam em cada coração e mente, contudo, ainda, não estamos na idade de morrer jovem por não estar nessa plenitude, e se acontecer, seria pouco lindo e bonito. 

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