A influência e a sabedoria parecem ter sido substituídas por um fluxo incessante de conselhos vindos de jovens bem vestidos e com uma aparência impecá
Nos anos sessenta, setenta e oitenta, Juvêncio não era apenas um catequista, um professor de explicação, um barbeiro ou um criador. Ele era um verdadeiro representante da comunidade, cuja presença irradiava uma calma inabalável e um respeito profundo. Para muitos, ele era a personificação do silêncio eloquente, respondendo a muitas questões com uma serenidade que, aos olhos dos outros, parecia ser apenas um silêncio profundo, mas que na verdade carregava um mundo de ensinamentos.
Herdei desse silêncio, dessa comunicação que fala mais do que mil palavras. Herdei a vontade incessante de aprender, a paixão pela leitura e a busca pelos livros, embora ele se limitasse à Bíblia e às palavras do profeta. Com o tempo, percebi que essa forma de comunicação era um legado de meu avô, um presente que meus irmãos e primos também carregam.
A sabedoria que ele transmitia era sentda e ouvida por muitos e marcou gerações fez semnetra a nosa identidade, como disse o David Diop, cuja obra nos lembra que “A nossa cultura é uma memória mais antiga que os rios” obra "Africa". Ou na serenidade que encontramos nas palavras de Léopold Sédar Senghor, que escreveu: “O tempo é um poço de areia, e nós, uma gota de água” obra "Poésie et civilisation". para mim, esses versos refletem o peso da experiência e a profundidade do silêncio que Juvêncio possuía.
No entanto, ao olhar para a geração atual, sinto uma inquietude. A influência e a sabedoria parecem ter sido substituídas por um fluxo incessante de conselhos vindos de jovens bem vestidos e com uma aparência impecável, mas que não possuem a mesma profundidade de experiência de vida dos nossos pais e avós.
Há algo de peculiar na nossa sociedade cabo-verdiana atual: muitos, jovens e não só, têm-se deixado levar por vozes efémeras que fazem barulho nas redes sociais, ignorando os conselhos preciosos daqueles que viveram e erraram, mas aprenderam com suas experiências. A influência é agora medida pela popularidade nas redes e não pela profundidade da vivência. Esta realidade é retratada com agudeza no poema de Wole Soyinka, que nos lembra: “Aqueles que falam a língua do presente não compreendem o passado” obra "Telephone Conversation".
Penso nessa pressa e sagacidade da vida moderna. Ao buscar sabedoria no YouTube, encontro os mesmos conteúdos e conselhos que são replicados por influenciadores em várias partes do mundo. No entanto, esses influenciadores frequentemente referenciam os grandes pensadores – Napoleon Hill, Dale Carnegie, Robert Cialdini, Stephen R. Covey, Daniel Goleman – aqueles cujas ideias foram moldadas por uma profunda compreensão da vida.
E, em meio a essa avalanche de novas vozes, o velho ditado de Carlos de Sousa Mendes “Princezitu” continua a nos explodir no pensamento e com a sua verdade intocável: "Mamba é mi ki é bakan." A sabedoria não reside apenas nas palavras de quem parece saber muito, mas na experiência silenciosa daqueles que viveram e aprenderam. Juvêncio Loff, com seu silêncio eloquente, continua a ser uma fonte de inspiração e um lembrete de que a verdadeira sabedoria, muitas vezes reside nas coisas mais simples e silenciosas. Esta reflexão é também aplicada pelo poeta senegalês Leopold Sedar Senghor, que sabiamente afirmou: “A memória é um livro onde cada página é um rosto” obra "Chants d’ombre".
Assim, ao contemplar a foto de meu avô, sinto uma profunda gratidão e um respeito imenso por sua vida e legado. Que possamos todos aprender a valorizar e ouvir as vozes silenciosas que têm tanto a ensinar.
Mario Loff
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