Essas mudanças no Governo denotam algum desnorte...
Apanhou-me de surpresa. O senhor Primeiro Ministro anunciara no inicio do ano uma remodelação governamental. Passado tanto tempo, já não esperava uma remodelação assim de repente. É verdade que os tempos, aqui nas ilhas, são outros e as remodelações podem ser anunciadas com mais de sete meses de antecedência, já ninguém escandaliza.
Vistas bem as coisas ninguém foi remodelado. Todos ficaram, uns com poderes reforçados, outros com poderes diminuídos, outros, ainda, enxovalhados publicamente. Houvesse um pingo de vergonha na cara, teríamos, de certeza, algumas auto-remodelações. Mas já não haverá nenhuma saída, presumo que o senhor Primeiro Ministro tenha falado com todos, antes do anúncio público.
Desta restauração do governo, é disso que se trata, desde logo três conclusões: a fragilização do Primeiro Ministro, a ausência de uma orientação estratégica e a redução do potencial de coordenação intra-governamental.
Não se entende a criação do cargo de vice-primeiro ministro, para coordenar as áreas mais sensíveis da governação e as reformas estruturais. Geralmente, os cargos de vice-primeiro ministro são criados em governos de coligação. Em finais da década de 90, Carlos Veiga criara o cargo para nomear o seu sucessor. Será que, desta feita, mais cedo, o PM e líder do MPD já está a preparar a sua sucessão em 2021, altura em que ele mesmo poderá candidatar-se a Presidente da República? Se assim não for, porquê criar o cargo, agora, num país de tão reduzida dimensão territorial e populacional, cujo PM prometera um governo enxuto? Na prática, pelo desenho organizacional anunciado, teremos um governo com dois primeiros ministros, sendo que o escolhido pelo povo sai visivelmente fragilizado deste processo restaurador. As mudanças estruturais mais importantes em curso deveriam ser lideradas pelo PM que o povo escolheu nas urnas. Ao demitir-se das suas responsabilidades, está a fragilizar-se claramente e a transmitir uma imagem frouxa à sociedade civil e aos cidadãos.
O Dr. Ulisses Correia e Silva quer ser Primeiro Ministro, mas não quer dar o corpo ao manifesto e gerir os dossiers mais difíceis e complexos da governação. Aparece nos momentos de consagração, fugindo a sete léguas de questões mais delicadas que podem erodir a sua imagem. Veja-se como geriu a contestação à construção do Campus da Uni-CV na Praia ou a descida de Cabo Verde no ranking da boa governação da Mo Ibrahim. A culpa, nestes casos, era do Governo anterior. Já na inauguração do Porto da Palmeira, no Sal, ele estava a concretizar a visão do seu governo para a economia marítima.
Essas mudanças no Governo denotam algum desnorte: para a coordenação da área económica e financeira nomeia-se um Vice-Primeiro Ministro. Já para a coordenação da área política nomeia-se um Ministro de Estado. São criados dois Ministérios, um do Turismo e Transportes e outro da Economia Marítima. Em qual desses ministérios ficará, por exemplo, os transportes marítimos?
A criação do cargo de Ministro-Adjunto do Primeiro Ministro para a Integração Regional é, na minha humilde opinião, um absurdo. Em primeiro lugar, desde que assumiu funções, o Primeiro Ministro deixou a participação de Cabo Verde nas Cimeiras da CEDEAO ao Presidente da Republica; em segundo lugar, fica-se sem saber se as questões da União Africana também estarão sob a alçada do PM ou do Ministro dos Negócios Estrangeiros e Comunidades. A separação da integração regional na CEDEAO de outros dossiers como a parceria especial com a União Europeia ou as relações com outros espaços geopolíticos de maior importância para Cabo Verde é para mim um erro. Não tendo a coragem de responsabilizar o MNEC pelo descalabro da candidatura de Cabo Verde à presidência da Comissão da CEDEAO, retira-lhe a pasta e mantém-no no cargo. E o Ministro não tuge nem muge.
Por outro lado, o emprego fica com o Vice-Primeiro Ministro, o trabalho com a Justiça, a segurança social, regime contributivo com a Saúde e regime não contributivo com a Família e Inclusão Social, cuja titular é também Ministra da Educação e do Ensino Superior.
As estruturas governamentais refletem determinada estratégia de ação. A estrutura do governo que nos é agora apresentada todavia é confusa e só revela algum desnorte.
A criação de um Ministério da Economia Marítima com sede em São Vicente é uma medida isolada e desconexa que só confirma a confusão e a veia centralizadora do Governo em funções.
Afinal, esta restauração governamental serviu apenas para rapar a panela - percebe-se que em menos de dois anos o PM já não tem soluções para o Governo, socorrendo-se da cocorota -, alimentar egos e distribuir taxos a alguns boys.
Jose Maria Neves
Vistas bem as coisas ninguém foi remodelado. Todos ficaram, uns com poderes reforçados, outros com poderes diminuídos, outros, ainda, enxovalhados publicamente. Houvesse um pingo de vergonha na cara, teríamos, de certeza, algumas auto-remodelações. Mas já não haverá nenhuma saída, presumo que o senhor Primeiro Ministro tenha falado com todos, antes do anúncio público.
Desta restauração do governo, é disso que se trata, desde logo três conclusões: a fragilização do Primeiro Ministro, a ausência de uma orientação estratégica e a redução do potencial de coordenação intra-governamental.
Não se entende a criação do cargo de vice-primeiro ministro, para coordenar as áreas mais sensíveis da governação e as reformas estruturais. Geralmente, os cargos de vice-primeiro ministro são criados em governos de coligação. Em finais da década de 90, Carlos Veiga criara o cargo para nomear o seu sucessor. Será que, desta feita, mais cedo, o PM e líder do MPD já está a preparar a sua sucessão em 2021, altura em que ele mesmo poderá candidatar-se a Presidente da República? Se assim não for, porquê criar o cargo, agora, num país de tão reduzida dimensão territorial e populacional, cujo PM prometera um governo enxuto? Na prática, pelo desenho organizacional anunciado, teremos um governo com dois primeiros ministros, sendo que o escolhido pelo povo sai visivelmente fragilizado deste processo restaurador. As mudanças estruturais mais importantes em curso deveriam ser lideradas pelo PM que o povo escolheu nas urnas. Ao demitir-se das suas responsabilidades, está a fragilizar-se claramente e a transmitir uma imagem frouxa à sociedade civil e aos cidadãos.
O Dr. Ulisses Correia e Silva quer ser Primeiro Ministro, mas não quer dar o corpo ao manifesto e gerir os dossiers mais difíceis e complexos da governação. Aparece nos momentos de consagração, fugindo a sete léguas de questões mais delicadas que podem erodir a sua imagem. Veja-se como geriu a contestação à construção do Campus da Uni-CV na Praia ou a descida de Cabo Verde no ranking da boa governação da Mo Ibrahim. A culpa, nestes casos, era do Governo anterior. Já na inauguração do Porto da Palmeira, no Sal, ele estava a concretizar a visão do seu governo para a economia marítima.
Essas mudanças no Governo denotam algum desnorte: para a coordenação da área económica e financeira nomeia-se um Vice-Primeiro Ministro. Já para a coordenação da área política nomeia-se um Ministro de Estado. São criados dois Ministérios, um do Turismo e Transportes e outro da Economia Marítima. Em qual desses ministérios ficará, por exemplo, os transportes marítimos?
A criação do cargo de Ministro-Adjunto do Primeiro Ministro para a Integração Regional é, na minha humilde opinião, um absurdo. Em primeiro lugar, desde que assumiu funções, o Primeiro Ministro deixou a participação de Cabo Verde nas Cimeiras da CEDEAO ao Presidente da Republica; em segundo lugar, fica-se sem saber se as questões da União Africana também estarão sob a alçada do PM ou do Ministro dos Negócios Estrangeiros e Comunidades. A separação da integração regional na CEDEAO de outros dossiers como a parceria especial com a União Europeia ou as relações com outros espaços geopolíticos de maior importância para Cabo Verde é para mim um erro. Não tendo a coragem de responsabilizar o MNEC pelo descalabro da candidatura de Cabo Verde à presidência da Comissão da CEDEAO, retira-lhe a pasta e mantém-no no cargo. E o Ministro não tuge nem muge.
Por outro lado, o emprego fica com o Vice-Primeiro Ministro, o trabalho com a Justiça, a segurança social, regime contributivo com a Saúde e regime não contributivo com a Família e Inclusão Social, cuja titular é também Ministra da Educação e do Ensino Superior.
As estruturas governamentais refletem determinada estratégia de ação. A estrutura do governo que nos é agora apresentada todavia é confusa e só revela algum desnorte.
A criação de um Ministério da Economia Marítima com sede em São Vicente é uma medida isolada e desconexa que só confirma a confusão e a veia centralizadora do Governo em funções.
Afinal, esta restauração governamental serviu apenas para rapar a panela - percebe-se que em menos de dois anos o PM já não tem soluções para o Governo, socorrendo-se da cocorota -, alimentar egos e distribuir taxos a alguns boys.
Jose Maria Neves
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