Tarrafal, assistiu ontem a um acontecimento inédito, uma família muito pobre foi exposta à humilhação do despejo de imóvel à muito aban...
Tarrafal, assistiu ontem a um acontecimento inédito, uma família muito pobre foi exposta à humilhação do despejo de imóvel à muito abandonado pelos sucessores, diga-se, "herdeiros" e ocupado ao longo do tempo, por varias gerações de famílias, para nos últimos 30 anos, vir a ser ocupada pela Sra Eugénia que também pertence à família. Contudo, peço a devida autorização aos Juristas profissionais, eu que sou só um estudante de direito para fazer a seguinte análise do caso:
Tratando-se de uma matéria de Direito Real e baseado nos requisitos para aplicação do instituto da Usucapião, encontramos suporte suficiente que contraria a decisão do tribunal da comarca do Tarrafal, senão vejamos:
1. Noção: A posse de direito de propriedade ou de outros direitos reais de gozo, mantida por certo lapso de tempo, faculta ao possuidor, salvo disposição em contrario, a aquisição do direito a cujo exercício corresponde sua atuação: é o que se chama usucapião. artigo1284 Código Civil Cabo verdiano (CCCV);
2. Se considerarmos que a família despejada está na posse à 30 anos, que adquiriu por abandono do antigo possuidor ou se quisermos proprietário ou supostos sucessores, pois o numero 1 do artigo 1264 diz na sua alínea "A" que o abandono constitui uma das condições para perda de posse, mesmo não tendo registado esta posse, passa esta a contar para efeito de usucapião, pois está de boa fé e sua posse é publica, ou seja todos sabemos que Eugenia mora naquela casa e que se não fosse ela o prédio já estaria em ruínas à muito tempo;
Portanto, na falta de registo do titulo da posse, pois dona Eugenia não tinha como fazê-lo, por ter ocupado por abandono, portanto não existe um titulo de posse e por desconhecimento não fez o registo de mera posse, que é o caso, no entanto,fica mesmo assim protegida pelo artigo 1293 do CCCV que passo a citar: Não havendo registo de titulo nem de mera posse, a usucapião só pode dar-se no termo de 15 anos se a posse for de boa fé e de 20 anos se a posse for de má fé, ou seja o legislador, mesmo garante o direito do possuidor mesmo que este esteja de má fé passados 20 anos na posse do imóvel.
E Agora, o que dizer da senhora Eugenia com sua família que está à 30 anos!!!???
Por outro lado, o Instituto da Manutenção e restituição da posse - artigo 1275 nº1 CCCV- Manda que a pessoa perturbada ou esbulhada, ou seja, enganada, será mantida ou restituída sua posse, em caso de recorrer ao tribunal, enquanto a parte que reclama a titularidade não provar convincentemente. Este artigo se aplica perfeitamente ao caso, pois existem muitas duvidas quanto à veracidade da titularidade apresentada pelos requerentes.
Com base neste argumentos legais, ainda pode-se invocar o instituto de abuso de direito, pois de acordo com o artigo 334 do CCCV, é ilegítimo o exercício de um direito, quando exceda manifestamente os limites impostos pela boa fé, pelos bons costumes... e neste caso, os bons costumes foram flagrantemente atacados, deixando uma família exposta à humilhação, coisa que nesta cidade nunca antes se tinha visto, sem falar de má fé, pois uma das requerentes, é Dirigente Municipal, Diga-se Deputada Municipal e conhece perfeitamente a condição social desfavorável da senhora Eugênia e não exitou em provocar seu despejo.
A Luz do artigo 1279 CCCV, senhora Eugenia tem 1 ano, a partir de ontem, para intentar uma ação de restituição de sua posse, baseada nos argumentos já apresentados e finalmente, caso o tribunal venha a considerar validos estes argumentos e sua posse venha a ser restituída, estabelecer-se-á ainda a indenização por prejuízos e encargos com a restituição, ao abrigo do artigo 1281 CCCV no seu numero 1 que diz assim: O possuidor... restituído, tem direito a ser indenizado(a) do prejuízo que haja sofrido em consequência da perturbação ou do esbulho, o mesmo que dizer enganado, possibilidade que não é posta de lado.
Não gostaria de concluir esta análise sem expressar que as autoridades municipais, particularmente a Camara, teria saído bem na "fotografia" se tivesse providenciado pelo menos uma instalação provisória para abrigar a família, enquanto a situação se normaliza. resta manifestar toda a solidariedade à família de Dona Eugenia, e aproveitar para pedir a solidariedade de Advogados que queiram abraçar esta causa, mas também pedir a boa consciência do ministério publico para que enquanto defensor publico, reanalise este caso. por Paulo Varela